Ora, a puberdade é necessária. As crianças vitimadas pela prática da mutilação e envenenamento hormonal tornada mandatória pela ideologia de gênero terão fatalmente outros problemas gravíssimos ao longo de toda a vida. Além do evidente (a castração), eles terão ossos extremamente frágeis, distorções de crescimento e problemas de vários outros tipos. Sem falar, claro, nos imensos problemas psicológicos causados pela fantasia que são obrigados a viver a partir do momento em que tudo – da identidade legal à aparência – a a depender da manutenção de um programa de envenenamento hormonal sistemático.
Outras vítimas dos mesmos delírios ideológicos que negam a realidade e tentam transformá-la cirurgicamente numa mentira são as pobres pessoas a quem a castração e o envenenamento hormonal são vendidos como “solução”, quiçá “cura”. Falo da condição dita “disforia de gênero”. Ora, uma “disforia” (antônimo de “euforia”) é uma psicopatologia. Segundo o venerável Dicionário Houaiss, trata-se de um “estado caracterizado por ansiedade, depressão e inquietude”. Destarte, é “disfórico de gênero” quem se vê ansioso, deprimido e inquieto e atribui este mal-estar ao seu “gênero” (ou seja, sexo). Ora, existem pessoas com disforias alimentares, que se percebem como obesas mesmo sendo macérrimas. Poder-se-ia perfeitamente dizer que elas estão ansiosas, deprimidas e inquietas por perceber-se obesas. Mas a obesidade delas é tão real quanto o pertencimento ao sexo oposto do disfórico “de gênero”.
Não é o que prega o discurso obrigatório da nova ideologia, contudo. Para ele, a fantasia ideológica deve ter preponderância sobre a realidade e orientá-la na transformação do que é existente no que é desejado. Estas pessoas, assim, são convencidas por carniceiros a fazer-se mutilar cirurgicamente, com os homens literalmente tendo o pênis virado ao avesso para simular uma vagina Frankenstein (evidentemente infértil) e as pobres moças tendo os seios arrancados. Além disso, toneladas de venenos hormonais são derramados sistematicamente em seu corpo, de modo a simular alguns aspectos exteriores do sexo oposto, ao qual, evidentemente, não pertencem, nunca pertenceram e jamais pertencerão, independentemente das fantasias de que sofrem, da mutilação e dos hormônios. O que se faz, na verdade, é um mero disfarce carnavalesco, com a desvantagem da mutilação e envenenamento.
Num excurso pela baixa literatura, lembro-me do personagem Arsène Lupin, o Ladrão Cavalheiro, fruto típico daquele auge da modernidade do Entre-Guerras, quando tudo parecia possível para a “Ciência”. Ele sabia disfarçar-se com o auxílio de produtos químicos que ora descoloriam sua pele, ora a empalideciam ou mudavam sua voz, além de sapatos que aumentavam a sua altura, coisas que introduzia nas bochechas e narinas ou a elas pespegava para mudar a fisionomia, além, claro, de roupas de ambos os sexos e demais disfarces fantásticos e elaborados. Ora, é exatamente isso o que se convence a fazer os pobres portadores de uma psicopatologia – ou seja, de um problema que está “na cabeça”, não no corpo. São meros disfarces, que contudo são obtidos pela mutilação e envenenamento. Lupin, creio eu, jamais chegou a mutilar-se, ao contrário das vítimas desta nefanda ideologia. É realmente criminoso o abuso realizado contra pessoas que, justamente por conta da psicopatologia de que sofrem, não são plenamente capazes de dar consentimento a mutilações e envenenamentos.
Não é à toa que o porcentual de suicídios de “pessoas trans” seja muitíssimo superior ao de qualquer outra categoria, incluindo prisioneiros e doentes terminais
Esta ideologia, assim, ao contrário das demais, tocando em algo tão próximo ao cerne do que constitui um ser humano, ataca com violência muito maior. Certamente sofria um menino judeu alemão, ou um filho de kulaks na União Soviética, que era entregue pelos pais preocupados a uma família amiga “ariana” ou “proletária” para que não sofresse a violência mortífera que se derramava sobre sua família. Seu sofrimento, todavia, empalidece com o dos que são forçados – seja em criança, seja durante um período de disforia – à mutilação genital e mamária e ao envenenamento hormonal sistemático. Não é à toa que o porcentual de suicídios de “pessoas trans” seja muitíssimo superior ao de qualquer outra categoria, incluindo prisioneiros e doentes terminais: sua própria identidade como ser humano lhes foi negada. O problema não é um suposto preconceito ou supostos maus-tratos por parte da sociedade, e sim o conflito identitário interno que os violentíssimos meios empregados na negação de sua realidade físico-biológica não têm como não causar.
A ideologia de gênero insere-se dentro do quadro do que alguns chamam “marxismo pós-moderno”. Trata-se de um termo bastante inexato, mais político que científico, mas no caso ele pode nos ajudar a perceber o que está acontecendo. O marxismo clássico pretendia prever o futuro da sociedade, que percebia como consistindo apenas em situações econômicas que determinariam e causariam relações de opressão efetuadas através de uma superestrutura a serviço da classe dominante. Já o marxismo pós-moderno fragmenta a percepção de relações de opressão: em vez de focar no proletariado (que a prática revelou ser extremamente conservador, ao contrário do que previa a teoria marxiana), os pós-modernos buscam classes alternativas de “oprimidos” para incentivá-las a levantar-se contra a superestrutura. Desta, evidentemente, como na visão leninista, faz parte o quadro familiar. Eles não deixam de ter razão, apesar de ser uma razão enlouquecida (bem dizia Chesterton que um louco é alguém que perdeu tudo, menos a razão): é a família que compõe a base da sociedade. Se uma pessoa percebe a sociedade como uma superestrutura maligna que deve ser derrubada, saindo daí necessariamente algo melhor, como é o caso dos marxistas pós-modernos, atacar a família surge como necessário. Sem a família seria possível – creem eles – criar uma sociedade igualitária, verdadeiro paraíso na terra. Todos os males viriam dela, na medida em que a ordenação social seria a causa de todos os males e toda ordenação social ocorre a partir da família.
Ora, a família é composta de um homem e uma mulher, que se unem e assim geram e educam filhos. É por isso que a ideologia de gênero tenta negar o que é ser homem e o que é ser mulher, assim como a Revolução Sexual – oriunda do mesmo quadro de péssima filosofia – atacou e ataca freneticamente a relação natural entre sexo e reprodução, tratando a fertilidade como doença e envenenando hormonalmente as mulheres para que seus ventres definhem e se tornem infecundos. Deste envenenamento hormonal das mulheres, provavelmente, surgiu a ideia do envenenamento associado à mutilação para criar supostos “gêneros” novos, que negariam liminarmente a divisão natural binária da espécie em homem e mulher. Assim puderam eles atacar, usando como bucha de canhão crianças e pessoas com problemas psiquiátricos sérios, a base natural da instituição do matrimônio, que é a diferença radical e essencial entre homem e mulher. Na União Soviética e na Alemanha nazista isso foi tentado por outros meios. Não funcionou. A natureza é mais forte; mesmo que uma ditadura distópica conseguisse separar completamente sexo e reprodução, com crianças criadas em úteros artificiais, como no irável Mundo Novo de Huxley, em algum momento um rapaz olharia para uma mocinha, ela o olharia de volta, e, quando menos se esperasse, uma família se constituiria. Isto está na natureza humana. A família é eterna; a família é invencível.