Em sua posse no TCU, Jhonatan prometeu não usar seu cargo no TCU para perseguições políticas. “Ninguém sob a minha orientação será condenado baseado em interesses de grupos ou de pessoas que queiram transformar o Tribunal de Contas da União numa arena de perseguição política dos seus adversários”, disse, em fevereiro deste ano. 2g2513

Para mensurar o total gasto no evento, Jhonatan de Jesus acionará a área técnica do TCU, composta por auditores concursados. Depois, com base no resultado dessa apuração, poderá propor ao colegiado do órgão, formado por outros sete ministros, a abertura de uma fiscalização – chamada tomada de contas especial – se considerar que há indícios de mau uso de recursos públicos. Em caso de condenação, o órgão poderá aplicar punições como multa e ressarcimento ao erário.

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Barreiras à extensão da inelegibilidade 2f27

Do ponto de vista estritamente jurídico, a possibilidade de Bolsonaro perder o direito de ser votado por mais tempo, por decisão do TCU, a por várias etapas e não é tão simples de se atingir, segundo especialistas no tema consultados pela Gazeta do Povo.

O obstáculo mais recente foi firmado em 2016, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a desaprovação das contas de um prefeito, por um tribunal de contas municipal ou estadual, não seria suficiente para impor a inelegibilidade.

A maioria dos ministros entendeu que uma decisão do tipo deveria ser ratificada pelos vereadores. Na prática, a palavra final caberia ao Legislativo local. Isso valeria tanto para as contas de governo – relativas à execução do orçamento em determinado ano – quanto para contas de gestão – relativas a alguma despesa específica ocorrida durante o mandato.

As contas de governo de Bolsonaro, relativas ao orçamento de 2022, já foram aprovadas pelo TCU no início de junho.

Restaria ao TCU analisar as contas de gestão relativas à despesa da reunião com os embaixadores. Mas uma eventual desaprovação só geraria inelegibilidade se fosse aprovada na Câmara dos Deputados.

“Na minha concepção, eventual desaprovação das contas pelo TCU teria de ser submetida à Câmara, pois a regra fixada em 2016 não pode ser relativizada. Se relativiza a regra para o mais [o presidente], iria também relativizar para o menos [o prefeito], e aí contrariaria o precedente que acabou de ser firmado”, diz o advogado Sidney Neves, atual presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ele ressalva que essa opinião não representa, necessariamente, o entendimento da entidade de classe.

É o que também entende a advogada eleitoral Ana Márcia Mello, especialista no assunto. “O Tribunal de Contas da União não julga as contas do presidente da República, mas emite apenas parecer prévio anual sobre as contas do governo, tendo o STF já definido que essa competência do TCU é meramente técnica, e não jurisdicional. Em sendo assim, o parecer no sentido da rejeição de contas pelos Tribunais de Contas não implica em consequente inelegibilidade do governante, demandando expressa manifestação do Parlamento, que é o poder competente e responsável pelo julgamento das contas, e este sim é que, ao apreciá-las, deverá emitir juízo de valor quanto a natureza das irregularidades”, diz ela.

Para os analistas, a condenação necessária para uma inelegibilidade via TCU também não é simples de ser fundamentada. Para isso, a Ficha Limpa exige a ocorrência de uma “irregularidade insanável”, que configure um “ato doloso de improbidade istrativa”. Em geral, essas condições se amoldam a despesas grandes, na casa dos milhões, efetuadas pelo gestor com o intuito de se apropriar do recurso público.

“É quando o sujeito quer se locupletar e faz uma manobra para meter a mão no dinheiro”, explica Sidney Neves. “Nem sempre contas rejeitadas importam em inelegibilidade, e essa constatação deverá ser feita pela Justiça Eleitoral, quando da análise de eventual pedido de registro de candidatura”, acrescenta Ana Márcia Mello.

Improbidade istrativa 2p734

Não é nem o TCU nem o TSE que julga, propriamente, se houve improbidade istrativa em determinada despesa, mas sim a Justiça Federal. Os tribunais de contas e eleitorais, em geral, só avaliam, de forma superficial, se determinada despesa pode ou não indicar improbidade. O dolo em atos de improbidade, por sua vez, é interpretado como a intenção clara de obter ganho ilícito, e não com a ordem de efetuar uma despesa de forma equivocada por um gestor.

No caso da reunião de Bolsonaro com embaixadores, o único gasto documentado, até o momento, foi de R$ 12.214,12, relativo ao “planejamento e apoio logístico ao evento”, envolvendo sonorização, cenografia, gerador, de LED, coordenador de eventos e operador de equipamento audiovisual – ou seja, o aparato utilizado para a apresentação de slides num telão, feita pelo ex-presidente durante a reunião no Palácio da Alvorada.

O próprio TCU tem um entendimento de que despesas inferiores a R$ 100 mil inviabilizam a abertura de tomada de contas especial, ou seja, o procedimento de apuração dos gastos que antecede o julgamento sobre sua regularidade. Isso porque o tribunal poderia despender mais recursos para apurar o dano do que o próprio prejuízo causado por ele – seria um ato “antieconômico”.

Na representação em que pediu ao TCU para levantar os gastos da reunião, o subprocurador Lucas Furtado sinalizou que devem ser apuradas mais despesas, como as realizadas pela EBC para transmitir a reunião na TV Brasil e reproduzir seus trechos nas redes sociais.

“Mostra-se imprescindível, portanto, que esta Corte proceda à devida apuração do dano ao erário decorrente do uso da estrutura da EBC. Além disso, entende-se que o dano ao erário pode englobar também os custos com o uso da estrutura do Palácio do Planalto e eventuais gastos com a organização do evento”, escreveu no documento.

Sua expectativa é de que, somados, todos os gastos individuais para a realização do evento ultraem os R$ 100 mil, de modo a viabilizar a fiscalização pelo TCU.

Em razão das várias etapas e exigências para se alcançar uma inelegibilidade, Ana Márcia Mello não considera que haveria uma tentativa de tornar Bolsonaro inelegível no TCU, “mas apenas tramitação formal de uma prestação de contas de governo”.

“As contas do governo Bolsonaro deverão seguir a tramitação regular e formal para seu julgamento. Caso tenham ocorrido irregularidades, elas deverão ser analisadas no parecer do TCU e julgadas pelo Congresso Nacional. Acaso rejeitadas e uma vez presentes irregularidades insanáveis, que configurem dolo específico, assim reconhecidas por decisão irrecorrível, deve ser aplicada a lei, assim como ocorre com qualquer gestor, cabendo ao TSE analisar se é o caso de enquadramento no art. 1º, I “g” da LC nº 64/90”, resume a advogada, referindo-se à regra da Lei da Ficha Limpa.