De acordo com a decisão de quarta-feira, operações em edifícios ligados à atividade parlamentar podem, sim, ser alvo de investigações, buscas e apreensões ordenadas por juízes de instâncias inferiores, sempre que os alvos não sejam os detentores de prerrogativa de foro. Mas há uma série de nuances. No caso da Operação Métis, Fachin entendeu que a competência do Supremo tinha sido usurpada, porque havia a suspeita de que os policiais legislativos estavam agindo a mando de senadores – estes, sim, com foro privilegiado. Quanto às provas obtidas, o Supremo decidiu que escutas telefônicas em que há conversas de parlamentares devem ser anuladas. Mas outras provas, que dizem respeito apenas aos policiais investigados, poderão ser usadas em uma eventual ação contra eles, mas não contra senadores – é o caso de documentos e equipamentos de escuta apreendidos em 2016.
O entendimento adotado pelo Supremo pode ajudar a reverter uma decisão tomada pelo Tribunal de Justiça do Paraná em agosto de 2018. À época, a 1.ª Câmara Criminal da corte anulou o julgamento de dois diretores da Assembleia Legislativa, condenados a 18 anos de prisão cada um deles no escândalo dos Diários Secretos, revelado pela Gazeta do Povo e pela RPCTV. O argumento da defesa foi justamente o de que provas usadas para condenar José Ary Nassif e Claudio Marques da Silva deveriam ser anuladas, pois tinham sido colhidas durante operação no prédio da Alep, autorizada por juiz de primeira instância, e não pelo próprio TJ. O recurso do Ministério Público Estadual contra a anulação ainda não foi julgado.
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É evidente que uma operação policial realizada em dependências do Poder Legislativo, mesmo direcionada contra pessoas sem prerrogativa de foro, pode encontrar evidências que incriminem parlamentares. Mas, nestes casos, a atitude correta é simplesmente a de remeter essas provas à instância do Judiciário responsável por julgar essas autoridades, para que não haja usurpação de competência. O restante do material, desde que não envolva pessoas com foro privilegiado, pode fazer parte do conjunto probatório sem problema algum.
Como afirmamos em 2018, a mera possibilidade de que uma operação encontre algo que incrimine um detentor de foro privilegiado – em uma sede de Poder Legislativo ou fora dela – não deveria bastar para que ela tivesse de ser autorizada por uma instância superior do Judiciário. Pensar desta maneira significaria conceder foro privilegiado aos próprios edifícios, permitindo a outras pessoas cometer crimes dentro de suas dependências, crimes esses que só poderiam ser desvendados em operações autorizadas por TJs ou tribunais superiores, como se fossem cometidos pelos verdadeiros detentores da prerrogativa de foro.
O Supremo, assim, remove um obstáculo indevido ao combate à corrupção e outros crimes cometidos por pessoas que, sem ter prerrogativa de foro, usam as dependências de sedes do Poder Legislativo para suas atividades ilícitas, esperando abrigo no foro privilegiado das autoridades que ali trabalham. Que a jurisprudência estabelecida pelo STF seja seguida também no Paraná.