"O atual modelo de financiamento das universidades públicas brasileiras, na prática, transfere renda de pobres para ricos. A PEC 206, que prevê a cobrança de mensalidade dos mais ricos, vai na direção correta, pois ajuda a inverter essa lógica, impedindo que famílias muito pobres tenham que pagar pelo ensino superior de famílias que teriam plenas condições de arcar com esse custo. Não há como ser contra isso", disse. 694o6k
Mitraud informou que no momento está sendo discutido a constitucionalidade da proposta, mas que em uma comissão especial será possível debater e definir o modelo mais adequado à realidade brasileira, que, segundo ele, tem sido injusta com os estudantes brasileiros.
“Hoje, universidades públicas são pagas por toda a sociedade por meio de impostos. Grande parte dessa sociedade, porém, não consegue ar essas universidades. Em geral, os mais pobres, que são justamente os que pagam proporcionalmente mais impostos no Brasil. Nos parece mais justo que aqueles que am universidades públicas contribuam para o seu custeio, desde que, é claro, tenham condições para isso”, afirmou.
Já para o deputado federal Idilvan Alencar (PDT-CE), a proposta não tem nada de positivo e nem vai resolver a questão do financiamento da universidade pública. "É mais uma pauta-bomba que cria mais uma barreira de o aos mais pobres que, além de ar no Enem, vão ter que ficar provando todo ano que é pobre", argumentou.
A deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) declarou ser contra a cobrança de mensalidades nas universidades públicas, especialmente na forma como foi proposto. Mas disse ser necessário buscar uma solução para o financiamento do ensino superior. De acordo com a parlamentar, o projeto vai na contramão dos avanços recentes da educação e não deveria tomar como modelo o que é aplicado nos Estados Unidos.
"O perfil de quem faz faculdade pública vem mudando bastante, por conta do Sisu e da lei de cotas. Sei que essa proposta é inspirada no modelo americano, e os Estados Unidos estão enfrentando um problema gigantesco de endividamento da juventude, que estão enfrentando problemas para iniciar suas carreiras", ressaltou.
Como sugestão para solucionar o problema de financiamento, a deputada propõe olhar para o modelo australiano. Lá, após se formarem, os ex-alunos que atingem um patamar alto de renda pagam pelo curso.
"O que questiono não é a gratuidade, que segue sendo gratuito, mas sim quem está pagando essa conta? Precisamos definir e discutir formas mais efetivas e mais justas de definir quem paga, trazendo assim uma fonte de recursos que pode ser muito importante para valorização do ensino superior público", explicou.
Na avaliação do presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e ex-ministro da Educação no governo Dilma Rousseff (PT), Renato Janine, "cobrar pelo ensino superior público não resolveria os problemas". Em um artigo para o Jornal da Ciência, ele destacou que o público nas universidades mudou com a política de cotas, sendo em sua maioria de escolas públicas.
"Seria mais justo para a sociedade cobrar impostos de todos os que ganham mais, e não apenas daqueles que, ganhando mais, se eduquem. Porque a educação não deve ser entendida como um subsídio estatal para melhorar a renda dos educados, e sim como um investimento que a sociedade efetua para retornos importantes destinados a todos", escreveu o ex-ministro.
A estrategista de políticas públicas e diretora Executiva no Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais (Ceiri), Daniela Alves, reforçou que a realidade de outros países que cobram mensalidades não pode servir de parâmetro para o Brasil.
"Não existe uma análise profunda da nossa realidade. Será que os outros países têm o mesmo nível de desigualdade do nosso país? Não dá para comparar com países que já solucionaram problemas que persistem no Brasil. Precisamos fazer um diagnóstico das universidades públicas e a partir disso desenhar soluções factíveis", salientou.
Outro ponto crítico da proposta, de acordo com Daniela, é a não definição de critérios básicos de como e de quem seria cobrado as mensalidades. "Falam nos ricos, mas é muito aberto, não dá indicações de absolutamente nada. Temos que saber quem pode pagar e quem não pode pagar. São termos que para a população em geral tem um grande impacto financeiro", disse.
Do ponto de vista político e em um ano eleitoral, esse tipo de matéria poderia gerar instabilidade e criar um problema sem solução, na opinião do diretor da Associação Brasileira de Consultores Políticos e analista político Alexandre Bandeira.
"O que mais me preocupa é o timing que isso é colocado em pauta. Esse assunto precisa amadurecer, mas neste momento serve apenas em pautar um tema em ano eleitoral. Não é um assunto para ser resolvido, mas somente para ser anunciado. Não tem muito o que contribuir e vai ter uma discussão que não é necessária", disse.
Segundo Bandeira, a discussão da proposta nem deve vingar esse ano, já que os trabalhos legislativos não rendem durante o período de festas juninas e, em seguida, muitos parlamentares se direcionam aos estados para cuidar das eleições.
Em meio às polêmicas e contradições sobre a PEC, os deputados federais aprovaram na CCJ a realização de uma audiência pública para debater o assunto. Ainda não foi definida a data, mas alguns deputados já começaram a apresentar requerimentos para inclusão de nomes a serem ouvidos nessa audiência.
Os críticos à PEC querem ouvir estudantes, especialistas e estudiosos do ensino superior no Brasil e no mundo, reitores, professores, pessoal responsável pela gestão das universidades e o Ministério da Educação.
O autor da proposta, General Peternelli, já adiantou à Gazeta do Povo que pretende convidar o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Paulo Meyer, autor do artigo “O estudante de hoje financiado pelo profissional do amanhã: proposta de um sistema nacional de financiamento estudantil com pagamentos vinculados à renda futura – funcionamento e fonte de recursos”; o professor do Insper Ricardo Paes; a ex-diretora do Banco Mundial Cláudia Costin; e a representante do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp), que realizou visita técnica na Austrália.
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